Aleluia!
Em uma manhã nublada de outono um velho de feições pouco amigáveis atravessou a avenida diante da praça e se postou ali, de frente para o monumento de vidro que era o Tempest Place e armou sua pequena banquinha. Sobre uma já surrada toalha de mesa azul celeste ele pôs uma pequena caixa de madeira fechada. Ao lado da caixa ele colocou uma plaquinha de VENDE-SE. E só. A sua pequena vendinha se resumia àquela caixa de madeira antiga.
Os pedestres passavam observando aquele senhor e sua caixa. Ele ficou muito tempo ali de pé, olhando para o céu com aquela caixa de madeira à sua frente. Os curiosos já se perguntavam o que haveria ali. Um ou outro perguntou e quando o velho respondia que eles teriam que olhar-los, eles saíam meio assustados. Por caridade um dos camelôs que compartilhavam daquela praça lhe ofereceu um banco que o velho, apesar da carranca, gentilmente aceitou.
O silêncio em volta daquela caixa era terrível. Os passantes que até então conversavam, ao passar pela caixa, pareciam monges prestando voto de silêncio. Ninguém ousava dizer nada perto do velho e sua caixa de madeira.
No entanto, após vários minutos de quietude, um jovem engravatado, digno de um tribunal ou de alguma partição pública, atravessou a rua, faminto por aquela caixa. Em seu âmago algo lhe atraía nela. Sentiu desejo, sem saber de onde. Ao vê-lo, pela primeira vez no dia, o velho sorriu. Um sorriso nada amigável para falar a verdade, algo de fera. Uma fera diante de uma presa muito saborosa.
- Ei, senhor! Quanto custa essa maravilha? – perguntou o jovem afoito.
O velho encarou-o e disse um preço que amedrontaria qualquer outro, mas não aquele sedento jovem. Ele estava apaixonado por aquela caixa e a queria de qualquer forma. Emitiu um cheque sem nome ao velho e pediu para olhar a caixa. O velho deu caminho e ele pode abri-la. Porém, ao olhar para dentro, o jovem tomou um susto tão grande que o fez sair correndo. O velho perseguiu-o com os olhos e quando ele virou a esquina rasgou o cheque, voltando à cara dura de antes.
Durou muito tempo até que, surgindo do nada, uma moça, de aparência humilde e imensos óculos fundo-de-garrafa chegasse próxima ao velho. Ela olhava com cobiça aquela pequena caixa de madeira. Tocou cada um dos detalhes entalhados a muito por algum exímio artesão e posou as mãos sobre a tampa de maneira muito delicada.
- Quanto custa? – perguntou rápida e sagaz, de tal forma que parecia ameaçar o velho se este não se revela o preço.
O velho voltou a sorrir e disse um preço que muito diferia do anterior. Parecia estar julgando seus clientes. A moça olhou para a caixa de forma triste e parecia se lamentar.
- É muito, não teria alguma outra forma?
Agora o velho pareceu perder o sorriso de uma forma muito mais brusca. Não só voltou à seriedade, como também parecia começar a ficar nervoso. Tirou a caixa de debaixo das mãos dela e a trouxe para si. A moça quase urrou e pediu que ele lhe desse a caixa. O velho não permitiu e disse que fosse embora. A moça insistiu, pedindo para toca-la uma última vez então que ela iria. O velho ponderou e enfim deixou que fizesse a despedida. Ao ter em mãos a caixa à moça voltou aos olhos cobiçosos e a abriu, apenas para sair correndo dali, gritando. O velho, que já havia previsto o resultado, pegou a caixa e a tampou, colocando de volta a mesa.
Muito mais tempo correu e estava quase anoitecendo quando uma estranha figura surgiu. Em trajes frios demais para o tempo morno daquele dia ele subia a ladeira anterior à avenida de forma cabisbaixa, olhando para o asfalto. Não chegou nem a notar o velho e sua caixa parados ali. Algo como um relâmpago cruzou os olhos do velho ao notar o rapaz e pôs-se a admira-lo. Quando este passava a sua frente o velho interceptou. Fez uma oferta de que ele comprasse a caixa e ofereceu um preço muito mais modesto que os anteriores. Os olhos do rapaz caíram sobre a caixa e por um instante, muito curto, faiscaram. Infelizmente, ele não estava a fim de comprar nada, só queria ir para casa e deitar e dormir para talvez não mais acordar. Seu dia estava péssimo.
O velho compreendeu e ainda assim reforçou, baixando ainda mais o preço. O garoto travou uma batalha interna. Algo naquela caixa tentava lhe despertar o interesse. Algo muito forte e que estava quase ganhando. Por fim voltou a dizer que não. O velho pareceu magoado e suspirou. Pediu então que o rapaz ao menos tocasse a caixa e a abrisse. E por causa do olhar do velho, apenas por isso, ele aceitou. Tomou a caixa em mãos e a abriu. O efeito foi único.
Diante dele, dentro daquele pequeno artefato de madeira, um universo inteiro residia, sonolento e muito calmo. Pode ver lá no fundo, bem pequena, uma Terra azul e verde. Respirou fortemente e tornou a olhar o velho. Este sorria, finalmente um sorriso sincero e solidário.
- É possível isto? – perguntou o rapaz abismado.
O velho respondeu que sim, já que ele estava ali vendo. O garoto ponderou um pouco e disse que aceitava o preço. Surpreendentemente, o velho não quis. O garoto tentou aumentar o preço novamente e o velho continuou a recusar. Quando perguntou, o garoto recebeu uma resposta que o surpreendeu.
- Todos que hoje tentaram comprar essa caixa estavam dispostos, ou quase, a pagar imensas fortunas por um artefato que cobiçavam acima de sua vida. No entanto, nenhum deles se dispôs a visualiza-lo como ele realmente é por mais do que alguns segundos. Eles acham belo seu invólucro e a aura de poder que ele emana, no entanto, seu núcleo, o que realmente importa nele, que acarreta em responsabilidades, eles temem e fogem. Leve, meu garoto, leve com você e faça um bom uso. Creio que irá entender com...
O velho não chegou a terminar sua frase. O garoto chorava. Ele havia entendido. O velho entendeu sorriu meigamente e pediu desculpas, mas precisava ir. O rapaz pegou as caixas e deu um abraço no velho. Secou as lágrimas a tempo de ver esse cruzar a esquina e sumir. Diante de si estava o artefato mais interessante de toda a sua vida. Guardou a caixa com cuidado, devolveu o banquinho ao camelô e deu uma generosa gorjeta a ele pelo empréstimo. Por fim, pegou tudo que havia pertencido ao velho e que ele deixara ali e pôs-se a andar, de forma descontraída e alegre. Tinha muito que fazer, mas havia... Ora bolas, por que não? Riu feliz.
Pensou no velho então, na sua aparência humilde que escondia sua real função. Debaixo daquela barba desgrenhada, dos cabelos compridos amarrados em um apertado rabo de cavalo, das roupas surradas que pareciam pertencer a algum hippie, de todo aquele visual que espantava os outros, havia um dos seres mais poderosos de todo o mundo. O velho e bom Tempo...
Engraçado como os imortais parecem escolher os mais excêntricos métodos de passar seu poder adiante...
3 Comments:
Interessante... Creio que essa é a melhor definição para o seu texto...
^^
Sabe de uma coisa, eu também estou feliz por poder passar esse dia 12 acompanhada, meus 18 anos de espera também valeram a pena...
^^
Beijos!!!!
Cara o TI foi muito bom mesmo...e eu ainda acho que fomos o melhor grupo...o Lino soube manipular bem a conversa e dexar ela ineressante.Ja o debate do guilherme foi bem certinho mas despertou tanto interesse.O nosso ainda teve os telefones...td foi ao vivo.Sei la...o do Lira soh foi o melhor pelo fato de o Lira fazer parte do trabalho hehe.Quanto a historia...eu consegui entrar nela tipo um livro hehe, tais escrevendo legal...tu descreveu bem a situação.Foi massa...soh não entendi bem a moral...mas o que importa eh que foi legal hehe.Tchau!
errei, o certo eh> NÃO despertou tanto interesse
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